O termo etnocentrismo refere-se à forma de enxergar outra etnia — incluindo cultura, hábitos, religião, idioma e modos de vida — a partir dos padrões da própria etnia. Uma visão etnocêntrica não reconhece a alteridade e toma a própria cultura como ponto de referência para avaliar as demais. Consequentemente, o observador etnocêntrico tende a se perceber superior aos outros em aspectos culturais, religiosos ou étnico-raciais.
A palavra “etnocentrismo” é formada pelos radicais “etno”, que remete a etnia (ou conjunto de hábitos, costumes e cultura), e “centrismo”, que indica colocar algo no centro como referência.
Historicamente, grupos como a Ku Klux Klan exemplificaram práticas etnocêntricas ao buscar a manutenção da supremacia branca e a imposição do cristianismo. Segundo Everardo Rocha, antropólogo da PUC-Rio, o etnocentrismo consiste em uma visão de mundo que coloca o próprio grupo no centro e interpreta os demais a partir de seus valores, modelos e definições. No aspecto intelectual, isso dificulta a compreensão das diferenças; no plano afetivo, manifesta-se por estranheza, medo ou hostilidade. O etnocentrismo pode se relacionar com racismo, xenofobia ou intolerância religiosa, embora cada um desses termos possua especificidades próprias.
O racismo, por exemplo, se baseia na ideia socialmente construída de “raça”, que buscava hierarquizar os grupos humanos e associar características biológicas a níveis de desenvolvimento cultural. Essa visão, predominante na antropologia do século XIX, justificou a exploração de povos africanos, asiáticos, indígenas e de outras regiões pelos europeus.
A xenofobia, por sua vez, é o receio ou a rejeição ao estrangeiro. Uma perspectiva etnocêntrica tende a enxergar o estrangeiro como inferior em costumes, religião e cultura, reforçando o preconceito contra o que é percebido como externo ao grupo de referência.
O etnocentrismo religioso surge quando uma religião é considerada superior a outras. Historicamente, o cristianismo europeu foi imposto nas Américas durante a colonização, desqualificando crenças nativas e promovendo a catequização por meio de ordens religiosas, como os jesuítas. Hoje, formas de intolerância religiosa persistem, especialmente contra religiões de matriz africana, que muitas vezes são vistas como demoníacas ou erradas por praticantes de outras crenças.
No século XIX, o neocolonialismo europeu levou à ocupação e divisão da África, Ásia e Oceania por potências capitalistas, que buscaram justificar a exploração de forma científica. O darwinismo social, defendido por Herbert Spencer, aplicava a teoria da evolução para classificar povos em uma hierarquia racial, com europeus no topo e africanos no fim. No entanto, no final do século XIX e início do século XX, antropólogos como Franz Boas, Bronislaw Malinowski e Claude Lévi-Strauss contestaram essas ideias, promovendo o respeito à diversidade cultural e o relativismo, que defende observar cada cultura em seus próprios termos.
O relativismo cultural, embora essencial para estudos sérios das sociedades, exige cautela: práticas que violam direitos humanos, como a mutilação genital feminina na Somália, não podem ser justificadas apenas pelo argumento cultural.
A colonização das Américas também reflete o etnocentrismo europeu. Escritos de historiadores portugueses do século XVI, como Pero Magalhães Gândavo, mostram a visão hierárquica que considerava os povos nativos desordenados e inferiores, adotando o padrão europeu como referência cultural.
No Brasil contemporâneo, o etnocentrismo ainda se manifesta, por exemplo, quando moradores das regiões Sul e Sudeste se consideram culturalmente superiores aos das regiões Norte e Nordeste, ou quando se percebem estereótipos sobre a África como continente atrasado, ignorando o impacto histórico da exploração colonial. Um exemplo extremo de etnocentrismo histórico foi o regime nazista, que defendia a superioridade da suposta “raça ariana” e perseguiu sistematicamente judeus e outros grupos.
No contexto da antropologia do século XIX, o etnocentrismo era frequentemente utilizado para justificar a dominação de outros povos pelos europeus, servindo como base ideológica para exploração e colonização.